MONTEVIDÉU E PUNTA DEL ESTE – DELICIOSA CONTRADIÇÃO
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A dupla uruguaia exibe o melhor dos contrastes: uma é nostálgica e histórica; a outra, badalada e sofisticada
Montevidéu: um mergulho no passado
“Porta falsa no tempo, suas ruas olham o passado…”, escreveu (em tradução literal) o escritor argentino Jorge Luis Borges no poema Montevidéu. Entrar na capital uruguaia é exatamente isso: voltar a uma época de certo romantismo, em que as vilas começavam a se aglutinar como distritos, onde vizinhos se reuniam nas janelas para colocar a conversa em dia e as crianças corriam para escalar as árvores. Diferente das metrópoles da América do Sul, o pequeno munícipio não é abarrotado de moradores e quase não tem trânsito, fatos que nos convidam a apreciá-lo sem moderação.
O vento frio que sopra do Rio da Prata pode assustar no início, mas não tira a beleza daquelas águas, tão cultuadas pelos que nasceram às suas margens. Afinal, tudo cresceu em torno delas. Emoldurado pelas ramblas – espécie de calçadão – que compõem a orla e se estendem por mais de 20 quilômetros, o rio presenteia os cerca de 1,8 milhão de habitantes com praias de areia branca e água fria, que pontuam os bairros de Pocitos, Buceo, Carrasco, Ramírez, Cerro e Malvín.
“Nós somos diferentes”, comenta Gastón, o recepcionista do hotel, em um perfeito “portunhol”, quando perguntado por que escolheu morar na cidade. É fácil entender o porquê de tamanha convicção. Considerado um dos 30 municípios mais seguros do mundo, a arborizada Montevidéu mantém a aura acolhedora e nostálgica dos anos 1950. Mas também tem vida agitada. Grande parte do movimento gira em torno da Avenida 18 de Julio, a principal da cidade, com grande quantidade de lojas, cafés, hotéis e prédios comerciais. Nela é possível encontrar artigos de couro, como bolsas e carteiras, armazéns, bodegas e roupas com preços atraentes – graças ao câmbio favorável aos brasileiros.
A área central, popularmente conhecida como Ciudad Vieja, não é apenas recomendada para compras, afinal também abriga vestígios da história do país, como o Mausoleo de José Artigas, considerado herói nacional, bem abaixo da Plaza Independência. A antiga muralha Puerta de la Ciudadela está no cantinho da praça e não passa despercebida – não só pelo tamanho, mas por indicar o começo da rua de uso exclusivo para pedestres, Peatonal Sarandí, que leva à região central do bairro.
As ruas estreitas exibem arquitetura que vai do estilo colonial ao Art Déco, enfileirando restaurantes, bares e cafeterias. Uma das casas mais conhecidas do país, a La Pasiva, tem uma filial na área e é uma boa pedida para os amantes de comidas típicas, como o chivito (sanduíche feito com carne, presunto, bacon, mussarela, tomate, ovos e maionese) e o puchero (uma mistura de linguiça, pancetta, chouriço, verduras e caldo).
Perto dali está o Mercado del Puerto, que, apesar do nome, não é um mercado como estamos acostumados a ver. Funciona mais como um polo gastronômico, um daqueles lugares imperdíveis, aos quais não ir deveria ser passível de multa. A construção erguida com estruturas de ferro reúne 14 opções para degustar a autêntica parrillada (o churrasco à moda uruguaia, com cortes irresistíveis como o asado de tira e o ojo de bife) ou tomar um medio y medio, combinação inusitada de vinho branco e espumante.
O coração da cidade ainda revela mais surpresas. Entre os museus, merecem destaque o Torres García, dedicado ao famoso pintor uruguaio, o Museu Histórico Nacional, formado por um conjunto de oito mansões seculares com exposições de quadros, esculturas, desenhos e mobílias, e o Museu do Carnaval – sim, eles também festejam Momo, só que por 40 dias. Também há o Teatro Solis, com arquitetura inspirada em construções italianas, que traz na fachada o sol da bandeira uruguaia e apresenta quase que diariamente espetáculos a preços acessíveis e visitas guiadas. Em seu interior, as cadeiras em veludo vermelho, o lustre de cristal e as paredes folheadas a ouro o deixam ainda mais imponente.
Com tempo sobrando, passe pela Fortaleza del Cerro, que fica do lado oposto da baía, um pouco mais afastada da Ciudad Vieja. Última fortificação construída pelos espanhóis em solo uruguaio, ela tem uma pequena exposição de armamentos e arquivos históricos – e ainda conta com uma bela vista da cidade.
Pacata boemia
Engana-se quem pensa que Montevidéu oferece apenas atividades relacionadas à arte. Os apaixonados pela noite também podem curtir bares, pubs e discotecas. As baladas de maior frisson são Tranquilo, El Pony Pisador, Fun Fun e El Barzón, todas entre a zona sul e o centro, que tocam rock, pop, música eletrônica e latina. Se preferir algo mais tradicional, os bares Vieja Viola, Facal e Joven Tango dão aulas e promovem apresentações de tango e milonga. A idolatria por esses estilos musicais tão característicos pode ser percebida na polêmica discussão sobre onde nasceu Carlos Gardel – trama que envolve argentinos, franceses e uruguaios. O cantor morreu em 1935, mas o veredito sobre sua origem até hoje gera debates acalorados.
Se a boemia está longe de ser um hobby, caminhar por parques é uma boa pedida, principalmente quando se tem dentro de um deles o Estadio Centenario – um dos palcos da primeira Copa do Mundo da história, realizada em 1930 e vencida pela nação anfitriã. Localizado no Parque Batlle, a arena tem, além do campo, um museu que conta a história de sua construção e dos clássicos do futebol já sediados ali. Outra área verde famosa é o Parque Rodó, com monumentos, fontes, lago e pedalinhos, que enfatizam a sensação de tranquilidade tão presente na capital. Tem parque de diversões com carrossel e trem fantasma, campo de golfe e de futebol, castelo, anfiteatro, bares e o Casino Municipal.
Nas manhãs de domingo, o agito migra para a Calle Tristán Narvaja, onde acontece a feira homônima. Poderia ser um mercado de pulgas, não fossem os queijos, as frutas e os sanduíches nas barracas. Os montevideanos adoram caminhar por quadras e quadras com garrafas térmicas prontas para reabastecer suas cuias de mate (equivalente ao nosso chimarrão), em busca de antiguidades, roupas vintage, discos, livros, joias e todo tipo de quinquilharia. Não é um passeio que os guias turísticos costumam indicar, porém mostra ao visitante um dos princípios que tornam a vida na capital tão diferente: dar tempo ao tempo.
Punta pulsante: feita para entreter
Cansou do sossego de Montevidéu? Badalação e famosos combinam com você? Então é melhor se preparar para viajar 130 quilômetros até Punta del Este. Na cidade, pelo menos durante o verão, a calmaria não tem vez. Iates, cruzeiros e carros chegam aos montes e fazem o número de habitantes saltar de 10 mil para mais de 300 mil na alta temporada, em busca de boas praias, diversão e sofisticação. E, para os brasileiros, Punta é logo ali, distante apenas 200 quilômetros da fronteira com o Rio Grande do Sul. Tanto que figuramos no “Top 3” de visitantes estrangeiros que chegam entre dezembro e março.
O munícipio é banhado pelo Oceano Atlântico e pelo Rio da Prata, ou seja, tem opções de água doce e salgada, para alegria dos turistas. “Burburinho” é a resposta mais comum quando perguntamos aos uruguaios qual palavra descreveria Punta del Este. E é isso que se vê na orla durante as primeiras horas da manhã. As playas Brava, Mansa, La Barra, Montoya, José Ignácio e Bikini são as mais populares, atraindo tipos variados de frequentadores. A Brava, como o próprio nome diz, tem ondas fortes, indicadas para a prática de atividades marítimas, como surfe, windsurfe e jet ski. Ela ainda conta com um dos ícones do munícipio, o Monumento Al Ahogado, conhecido como La Mano. A escultura feita pelo artista chileno Mario Irarrázabal representa uma mão durante um possível “afogamento” e serve, além de parada obrigatória para foto, como alerta para os banhistas.
Outro ponto representativo é o Farol de Punta, no extremo da península. Construído em 1860, mantém sua estrutura intacta devido à argamassa usada, feita à base de terra vulcânica, mais resistente que o concreto. Tem uma vista incrível e rende fotos dignas de cartão-postal!
As famílias com crianças, em geral, preferem a praia Mansa, devido a suas águas calmas e cristalinas – porém, vale dizer, frias. Nela está o Conrad Punta del Este, um cinco estrelas com 294 quartos, sendo 41 suítes de luxo, spa, salão de beleza, piscinas, kids club, quadras de tênis, quatro restaurantes e bar com DJ. O hotel é famoso por seu cassino, aberto 24 horas, com 550 caça-níqueis, 72 mesas de jogos e uma sala VIP de 450 m² para os mais reservados. Reformado no final de 2013, ganhou novos slots de jogos, bar com terraço, espaço para shows e night club.
Os compradores de plantão também não ficarão de mãos vazias na cidade. A Calle 20 tem diversas butiques de grife, como Versace e Louis Vuitton; já a Avenida Gorlero traz opções mais acessíveis, com lojas que vendem calçados, roupas, suvenires, alfajores e vinhos. Por falar em vinhos, uma boa surpresa é a qualidade dos rótulos fabricados no Uruguai. Perto de Punta, uma opção para degustar umas taças e trazer garrafas para casa é a vínicola Alto de La Ballena, que tem bons tintos e rosés, em sua maioria feita com uvas merlot e tannat.
Um pouco mais afastada da península, a tranquila praia de La Barra coleciona habitués como Shakira, Ricky Martin e David Beckham, principalmente por seu ar glam. Para chegar nela é preciso atravessar as ondulações da Ponte Leonel Vieira, que causam frio na barriga até dos mais corajosos. Mansões, galerias de arte e pequenos comércios passam a fazer parte da paisagem, contrastando com as lojas de grife e os enormes prédios da região central. A aparente calmaria da praia desaparece ao pôr do sol, quando a música alta escapa dos bares próximos à orla. O Sabbia e o Tequila possuem as pistas mais agitadas e concorridas.
Caminhando um pouco mais para o leste, está a quase “selvagem” Playa José Ignácio, hippie chic que se destaca mais pela natureza que a cerca e não tanto por proporcionar banhos de mar, já que sua margem é rochosa. Lá está o disputado Parador La Huella, eleito o 20º melhor restaurante da América Latina pelo guia Michelin em 2013, graças a delícias como o brótola (peixe típico) com lagostins ao forno, acompanhado de doses de clericot (vinho branco com frutas).
Bem pertinho dali está Montoya, outro ponto favorito dos endinheirados e aspirantes a artistas, tanto pela sua extensa faixa de areia quanto por seus quiosques e restaurantes, cenários de inúmeros comerciais. Em suas águas turbulentas, frequentemente são promovidos campeonatos de surfe e outras modalidades aquáticas. A vizinha Bikini é um hot spot mais recluso e, portanto, um dos lugares preferidos dos famosos que visitam Punta. Na alta temporada, DJs animam os paradores e festas exclusivas acontecem na praia. Uma boa alternativa após um passeio pela areia é ir ao Flo Café & Bar e saborear medialunas recheadas de doce de leite.
Para aproveitar a bela vista que o litoral uruguaio proporciona, o pintor e escultor Carlos Vilaró construiu em 1960 na península de Punta Ballena, a famosa Casapueblo, sua residência de verão. O local é considerado uma cidadela-escultura, visto que o artista a desenhou e construiu ao longo de 30 anos. A arquitetura se assemelha às casas da costa de Santorini, na Grécia. Mas, em entrevistas, Vilaró dizia tê-la criado com base em ninhos do pássaro hornero – conhecido como joão-de-barro no Brasil. O interior lembra um labirinto e abriga um hotel com 72 acomodações, piscina, fitness center, bar, museu, galeria de arte, ateliê e lojinha com obras de Vilaró, que morreu em fevereiro deste ano. É tão simbólico que o prédio inspirou Vinicius de Moraes a compor os versos Era uma casa muito engraçada… Ah, e ainda é um dos melhores lugares para ver o sol se pôr! Muita gente vem ao entardecer para acompanhar a concorrida “cerimônia” nas sacadas da casa, com direito a um belo poema recitado por Vilaró ecoando pelos alto-falantes, no qual o artista se despede do astro.
Com o início da noite, o ideal é conhecer a vida noturna de Punta, pela qual ela é especialmente popular. Pubs, bares, danceterias e cassinos ficam lotados até de manhã. E, quando o assunto é festa, o Réveillon é a maior de todas. O show de fogos de artifício e as celebrações exclusivas atraem turistas de todas as partes do globo. Digno de um destino tão pulsante quanto Punta.
Serviços
Hospedar
Montevidéu
– Lafayette (Soriano 1170, lafayette.com.uy) A dez minutos das ramblas, tem bar e aluguel de bicicletas. Diárias para casal a partir de US$ 85, com café da manhã.
– Holiday Inn (Plaza Independencia, holidayinn.uy) Na zona financeira e cultural, conta com piscina, fitness center e sauna. Diárias para casal a partir de US$ 144, com café da manhã.
Punta del Este
– Golden Beach (Calle 24 com Calle 29, goldenbeach.com.uy) Próximo a Avenida Gorlero, tem piscinas, spa e wi-fi gratuito. Diárias para casal a partir de US$ 132, com café da manhã.
– Conrad (Rbla. Claudio Williman, Parada 4, conrad.com.uy) À beira da Praia Mansa, tem cassino recém-renovado, duas piscinas, spa e night club. Diárias para casal a partir de US$ 544, com café da manhã.
Comer
Montevidéu
– La Pasiva (Sarandí, 600, lapasiva.com.uy) Chivitos, choripanes e panchos são alguns dos pratos da rede de lanchonetes. $
– El Fogón (San José, 1080, elfogon.com.uy) Tradicional, tem a parrillada como carro-chefe, além de massas. De segunda a domingo, das 12h à 0h. $$
Punta del Este
– O’Farrell (Ruta 10, km 164,5, ofarrellrestaurant.com) Especializado em cozinha mediterrânea, tem boa carta de vinhos internacionais. Sábados e domingos, a partir das 20h. $
– Parador La Huella (Calle Los Cisnes, 44/862-279, paradorlahuella.com) Serve peixes, sushis e saladas. Recomendável reservar. $$
Passear
Montevidéu
– Mercado del Puerto (Piedras, 237, mercadodelpuerto.com.uy) Perfeito para amantes da boa comida, em especial, do churrasco uruguaio. Diariamente, das 12h à 0h. Entrada gratuita.
– Teatro Solís (Calle Reconquista, s/nº, teatrosolis.com.uy) Tem apresentações de música erudita e peças teatrais. De segunda a sexta, das 11h às 19h. Visitas guiadas de quarta a domingo, das 11h às 16h. Entrada: UYU 20.
– Museu Histórico Nacional (Rincón, 437, museohistorico.gob.uy) Formado por oito mansões seculares, com acervo sobre a história do país. De segunda a sexta, das 11h às 16h45. Entrada gratuita.
– Museu do Carnaval (Rambla 25 de Agosto de 1825, 218, museodelcarnaval.org) Acervo sobre a festa mais popular do país. De quarta a segunda, das 11h às 17h. Entrada: UYU 65.
Punta del Este
– Casapueblo (Ruta Panorámica, clubhotelcasapueblo.com) Complexo projetado por Carlos Vilaró, tem spa, hotel, galeria de arte, solário e fitness center. Diariamente, das 10h às 16h. Entrada: US$ 9.
– Alto de la Ballena (Ruta 12, km 16,4, altodelaballena.com) A vinícola oferece degustação de vinhos e queijos. Necessário reservar.
Badalar
Montevidéu
– El Pony Pisador (Bartolome Mitre, 1324 26, facebook.com/elponypisador) Famosa casa noturna com música ao vivo. De segunda a sexta, das 18h às 6h. Sábados e domingos, a partir das 20h.
Punta del Este
– Sabbia (Rbla. General Artigas, 20100, facebook.com/sabbiapunta) Boate descolada que toca de pop a música eletrônica. Diariamente, das 21h às 7h.
Boas compras
Montevidéu
– Shopping Punta Carretas (José Ellauri, 350, puntacarretasweb.com.uy) Em um antigo presídio, reúne as melhores lojas da cidade. Diariamente, das 10h às 22h.
Punta del Este
– Valentino (Calle 20 com Calle 25) Outlet da famosa marca italiana, com preços convidativos. De segunda a sexta, das 10h às 17h.
Fonte: http://www.revistaviajar.com.br/artigos/ler/906/montevideu-e-punta-del-este-deliciosa-contradicao#.VFjKx_nF8zY